Texto tirado do livro "A Grande Batalha" de Pietro Ubaldi , que nos mostra uma visão de como o se humano age com relação a si e aos outros , na aplicação de sua ética de uma forma egoísta . Um texto para refletirmos e estudarmos :
"O fato de nosso mundo
ser regido pela lei da luta pela seleção do mais forte, prova que está situado
ainda no plano animal-humano do involuído. Esse mundo baseia-se no princípio do
egocentrismo individualista que conduz do estado inorgânico, funcionando com o
método da rebelião. Isto não é um erro da vida, mas uma qualidade deste seu
nível de evolução. A vida quer, antes de mais nada, viver, qualquer
seja o seu plano de desenvolvimento alcançado. Alcança, assim, esta sua
finalidade, fundamental, porque não poderia diversamente alcançar nenhum de
todos seus outros fins; alcança aquela com os recursos que possui aquele plano
do involuído, salvo alcança-la diferentemente em planos mais elevados, onde
pode utilizar os meios mais aperfeiçoados conquistados pelo ser naqueles
planos mais elevados. A vida, desse modo, alcança a sua primeira finalidade, a
de viver, com garras e presas no plano animal, com a força e a astúcia no plano
humano, com a coordenação dos indivíduos num organismo coletivo, no plano do
evolvido. Os métodos e os resultados são proporcionais ao estado de evolução,
isto é, de compreensão e inteligência alcançada.
Explica-se desse modo
como a vida aceita no plano do involuído o estado de revolta egoísta, uma vez
que, nesse plano, este é legitimado por representar um ato de defesa da
própria vida. Dada a conformação do ambiente, se o animal não possuísse presas
e garras, como defenderia sua vida? Se o homem não usasse força e astúcia, como
conseguiria sobreviver? Se o evolvido não usa tudo isto é porque não o precisa
mais para proteger sua vida; sendo esta, no seu plano, protegida pelos meios
civis da organização social. A vida é lógica. A natureza é lógica. Para que
deveria continuar a usar o método do ataque e da defesa, quando este foi
superado e, portanto não há mais necessidade para garantir a vida?
Eis, porém, como o
nosso mundo, onde aquele método não foi ainda superado, se explica e justifica
o seu uso. E também explica-se como quando na terra nasce um evolvido, este
venha a ser reprovado. Quando o involuído o vê enquadrar-se espontaneamente na
ordem, disciplinar-se obedecendo às leis e formar, com isto, o seu valor, uma
sua força, o involuído o julga qual um imbecil incapaz de procurar sua própria
vantagem. Não conseguem eles compreenderem uma vez que possuem duas
mentalidades completamente diversas.
O evolvido desdenha
prostituir inteligência e energias numa luta inútil contra o seu semelhante,
seu companheiro de vida, em quem ele enxerga a si mesmo. No seu plano, a ordem
é realizada e isto basta para garantir a vida, na forma necessária num plano
em que a atividade deve ser utilizada em trabalhos e para conquistas
superiores. Para isso é que o seu espontâneo ato de defesa consiste no enquadramento
na ordem, eis que nesta ordem consiste toda a sua força de indivíduo orgânico.
Para o involuído as coisas
são diversas. Se ele abandona por um momento a luta contra o seu semelhante;
este o esmaga e o elimina. No seu plano ,não existe ninguém que garanta a sua
vida e ele tem que a garantir por si mesmo. Se não sabe defender-se ninguém o
defende, uma vez que cada qual tem a sua luta e não pode pôr a seu cargo a luta
dos outros. A inteligência e as energias devem ser usadas primeiramente para
esse fim, o mais urgente; aquele que as use para outras finalidades é julgado
um sonhador, vivente fora da realidade. O enquadramento na ordem, como método
de defesa, adotado pelo evolvido, nesse outro plano do involuído não tem
sentido, uma vez que uma ordem verdadeira não existe, aparecendo apenas algumas
tentativas de esboço. O mundo não possui ainda, senão alguns grupos
egocêntricos e imperialistas, constituídos em torno dos mais fortes, que os
usam, antes de mais nada, para si, ou em função de interesses de grupo. Tudo
isto não serve para garantir a vida, mas para organizar a luta em maior
escala. Aceitar uma tal ordem significa tornar-se servos de um determinado
chefe, que, por ser o mais forte, construiu a sua ordem para si. Nesse plano de
evolução, o poder, em geral, é suportado como um peso, enquanto é exercido
como uma vantagem por quem o possui. De fato, na terra, com o sistema
representativo, as massas procuram defender-se contra a opressão naturalmente
existente no poder absoluto. É assim que o cidadão moderno, começando a
evolver, procura defender-se contra um poder que tem sua origem histórica no
estado de opressão que o mais forte acreditava ser seu direito exercer sobre
os mais débeis que havia conseguido subjugar. Estamos no plano do involuído e,
enquanto assim ficarmos, toda forma de vida não poderá deixar de manifestar-se
a não ser com o sistema da luta, característica deste plano.
Como é possível
pretender da vida que seja dado ao involuído o instinto da obediência quando
esta não lhe traz vantagem alguma? Preferirá, por isso, a rebelião, quando esta
lhe for mais útil para a vida. Exigir que esta ande contra a própria conservação,
constitui absurdo biológico, admissível somente na mente do primitivo
ignorante, desconhecedor das leis da vida e que acredita possível impor-se também
a esta. De outro lado, é lógico que a vida dê ao evolvido o instinto da
obediência, quando existe uma ordem, e o disciplinar-se traga vantagem.
Na oposição entre os
dois diversos mundos, podem formar-se julgamentos diferentes, conforme se trate
do involuído que, do baixo ao alto, julga o mundo do evolvido, ou
trate-se do evolvido que julga do alto, o mundo baixo do involuído. Para o
involuído, aquele que se submete por motivo de ordem e de disciplina, não
é um virtuoso, mas um covarde que aceita a servidão, é um vencido
merecedor de desprezo. Teórica e oficialmente a palavra de ordem é diversa, mas
isto não evita que a substância dos instintos humanos seja esta. Para estes o
que conta é o homem forte, capaz de rebelar-se, impor-se, dominar, vencer.
Alcançar o sucesso é á que é apreciado. Quem vence tem razão pelo fato de
haver provado que sabe vencer.
Na história, a
vitória legitima tudo, porque é o vencedor o construtor da verdade,
naturalmente sempre para sua vantagem e glória. Quando estes são os instintos e
os métodos, todos endereçados à exaltação do mais forte e à
aniquilação do bom e do honesto, o que é possível esperar desse mundo senão um
estado de insegurança e de luta contínua? E não depende tudo, como havíamos
dito, da forma mental dominante? Tudo decorre de nossos instintos e de nossa
atuação conforme a psicologia correlata.
A obediência, a
disciplina, para o involuído e o evolvido, possuem significados de todo
diversos. Para o primeiro representa um dano, para o segundo uma vantagem. O
primeiro procura ser obedecido, o outro, obedecer. Para o involuído o homem
ideal é aquele que, em qualquer campo, consegue submeter os outros a si, aquele
que os outros menos conseguem dominar. Eis porque, quanto mais involuídos,
tanto mais consideram valoroso o rebelar-se à ordem. Por que, em alguns países,
ainda está em uso a blasfêmia É uma prova de coragem que se pretende alardear
desafiando até a Divindade, é um descaramento da coragem. Onde esta é
admirada, admira-se também a revolta, como prova de força. Como é possível
pretender, nesse mundo, não busquem as religiões sua sustentação no
terror da punição? Com tal instinto de revolta, se Deus não, fosse apresentado
como poderoso e vingativo, os homens se pudessem o devorariam.
É assim que se
explica a psicologia da antiga religião mosaica, apresentando um Deus modelado sobre a mentalidade do involuído a quem era destinado E, então, o homem o era
muito mais que hoje Devia, pois, ser proporcionada a ele a imagem de um Deus
que falasse conforme a psicologia dominante já que, de outra forma não seria
compreendido, nem respeitado. Eis um Deus ciumento de todos os outros deuses,
bem armado de punição para, conseguir obediência. Eis um Deus, cuja primeira
qualidade é a força sem a qual ninguém o teria temido. Ainda hoje o Cristianismo
é forçado a buscar apoio nos terrores do inferno, sem o que não seria ouvido
por muitos. Nas naturezas inferiores o temor é percebido muito mais do que o
amor. Os governos absolutistas e terroristas, de fato, são possíveis somente
nos povos menos civilizados.
Quando Moisés desceu
do Sinai e encontrou o seu povo adorando o Bezerro de Ouro, conforme relata a
Bíblia, o seu furor, em que expressou a ira de Deus, foi tremendo, e por isso
Moisés, chamando a si, a parte do povo permanecida fiel ,ordenou-lhe, em nome
de Deus, matassem todos os infiéis: "Cada um cinja a sua espada sobre a
coxa. Passai e tornai a passar de porta em porta pelo meio do arraial, e cada um mate a seu irmão, e cada um a seu companheiro e cada um a seu vizinho.
Fizeram os filhos de Levi conforme a palavra de Moisés; e caíram do povo
naquele dia quase três mil homens".
Se a Bíblia, na sua
singeleza, parece não aperceber-se da terrível contradição, isto não nos exime
do dever de procurar compreender as razões do fato. Pense-se bem: aquela
carnificina, Moisés a determinou em nome de Deus, para sustentar aquela lei que
a Bíblia declara ter sido escrita pelo próprio dedo de Deus no monte Sinal, lei
que, em um dos seus mandamentos fundamentais, determina: "não matar".
Aqui não procuramos condenar, mas, apenas, explicarmos um fato
acontecido e que apanharia Moisés em plena contradição. Como pode ter-se
verificado isto e que forças obrigaram Moisés a tão flagrante contraste consigo
mesmo, coisa que não é possível admitir fosse deliberadamente querida por ele?
O que obrigou Moisés
a agir de maneira oposta a que determinava a lei por ele trazida, foi, sem
dúvida, a forma mental própria dos homens pelos quais aquela lei devia ser
aplicada O escopo daquela lei era o de ensinar. Ora, não é possível ensinar a
um involuído, pretendendo que ele aprenda o que deve aprender, apenas com
demonstrações, exortações, apelando para uma inteligência ou bondade que ele
não possui ainda. Neste caso infelizmente há apenas um sistema: o de deixar
que o violador da lei sofra o dano resultante de seu erro. Isto pelo fato de
que, naquele nível de evolução, se pode aprender somente à própria custa. Se a finalidade a ser
alcançada é, de modo absoluto, a de que o indivíduo aprenda, não se pode evitar de o deixar pagar, em forma de
sofrimento, o respectivo custo.
Tão somente assim é
que se consegue explicar uma outra contradição semelhante, isto é, aquela de
que um Deus infinitamente bom e que nos ama irrestritamente, parece
encontrar-se em pleno contraste com aquelas suas qualidades quando verificamos
que Ele nos deixa sofrer desapiedadamente. Quando observamos que, nem sempre,
desse modo o homem aprende, força a concluir que, garantidamente e por sempre,
nada aprenderia se nem tivesse que suportar as consequências dos próprios
erros. A causa pois, desse procedimento, que parece absurdo, não esta na
contradição de Deus, mas na forma mental da criatura, que é a que, quando se
queira alcançar o seu bem, impõe esse método. Assim é, para o bem da criatura,
a qual compreende apenas a linguagem dura da dor, que Deus é obrigado a
tornar-se desapiedado. Não é possível fazer de outro modo quando,
respeitando-lhe a liberdade, se quer salvar um ser que não sabe agir senão com
a forma mental do rebelde que faz consistir todo o seu valor na força para
rebelar-se contra a lei, e não na inteligência para obedecer. A causa da dor,
por isso, não está em Deus, o que é inadmissível, mas está nesta errada
psicologia e conduta do ser.
Bastaria compreender
isto para poder eliminar com essa psicologia, também a dor que
dela deriva Mas, infelizmente, é exatamente aquela psicologia de egoísmo e
de revolta o que impede que nós mesmos não sejamos a causa primeira do mal. E, desse modo, a dor permanece. Mas é lógico, outro sim, que, alcançada, por
evolução, uma outra forma mental em planos de vida elevados, a dor desapareça,
não tendo mais que cumprir os anteriores fins educativos que são sua única
explicação e justificação no seio do amor, bondade e justiça de Deus. Absurdo e
blasfêmia seria o admitir haja sido Deus o construtor das cadeias da dor e que
a elas devamos permanecer sempre amarrados. Estas cadeias são devidas ao
estado de involução e devem desaparecer com a evolução cuja tarefa é
precisamente a de tudo corrigir e sanear, reconduzindo-nos à perfeição do
sistema. A dor existe para eliminar a si mesma."